Paris, 6
de dezembro de 2013
Quando eu
tinha 8 anos e estava cursando a segunda série do ensino fundamental, minha
professora sugeriu um redação como atividade de escola. Ela propusera que
escolhêssemos um país e que imaginasse como seria a viagem. Meus amigos, em sua
maioria, escolheram países do Oriente, como Japão e China. Uma parte queria ir
aos Estados Unidos (especificamente a Disney). Eu não. Eu escolhi a França.
Fiz a
minha redação. Lembro dela muito mais porque mainha mostrou para as pessoas na
casa de Vovó Paé. Pelo o que eu me lembro, mainha achou-a bastante
interessante. Lembro que ela afirmou que a nota que eu tinha tirado, um 8, se
devia mais pelos erros de gramática e ortografia do que pelo conteúdo, que ela
achava impecável. Eu lembro qual era o erro de ortografia: era porque eu
escrevia “a gente fomos”: “A gente fomos pra o rio Sena, depois a gente subimos
na torre Eiffel”.
Hoje eu
tenho 24 anos, ou seja, o triplo da idade de quando escrevi essa redação. E
hoje eu estou em Paris. Por um desvio da rota de pesquisa (hehehe), a redação
se realizou de maneira extraordinária. Conheci diversos pontos da cidade que eu
desconhecia a época da redação, como o Sacre-Ceur, o Moulin Rouge (imortalizado
pelo musical), Montmartre (pela Amélie Poulain). Conheci os clichês da minha
redação também, como os já citados e o museu do Louvre (especificamente pela
Mona Lisa). E tive brilho nos olhos por conhecer tantos outros museus, como o
D’Orsay e o das Armas. Infelizmente não fui a Disney (acho que na minha redação
tinha esse passeio), porque acordei tarde e fiquei ainda guardando algum
dinheiro para o final da viagem. Mas fui a Champs Elysee, às praças famosas, à
Bastilha, espaço reconhecido como centro da revolução. Aqui a sensação é que
são tantos lugares imortalizados em nossos livros de história.
Uma
adendo: minha mente ensinada em espaços anticolonialistas fica a pensar sobre a
preponderância da França no nosso imaginário. É incrível como uma cidade parece
conter toda uma trajetória histórica que é utilizada para explicar o que nós
somos hoje. Essa hegemonia realmente justifica Paris ser reconhecida enquanto
uma cidade “Luz”, porque somos criados a crer que tudo surgiu aqui. Como acabei
por seguir a rota da Pintura, fiquei pensando o quanto meus avos fazem pinturas
semelhantes às dos impressionistas.
Se é
apenas uma construção social, bem, eu não sei, mas somos treinados a pensar que
tudo começou aqui e sabemos tão bem o nome dos reis, revolucionários, locais,
eventos que estão marcados nas esquinas dessa cidade que eu vou ceder um pouco.
Parece-me que todo mundo que se considera ocidental tem de vir a Paris. É a
nossa Meca (New York precisa mudar minha opinião).
Agora que
a viagem está no fim, percebi que as primeiras sensações que eu tinha, uma
chateação com o dono do quarto onde me hospedara em Lisboa e o medo de estar só
no final de uma viagem (quero voltar!), foram se evaporando pela experiência,
de modo tal que acho que valeu muito a pena estar aqui. Conheci aspectos dessa
cidade incríveis, como um metrô bastante eficiente e confortável (reparem nas
fechaduras das portas do vagão), um frio que não venta, pessoas que seguem
muito a etiqueta (uma domesticação do self incrível). Esqueci de diversos
detalhe e, por tal razão, essa redação é muito pouco rica diante da experiência
que vivenciei.
Apesar
disso, a imaginação que eu tive aos oito anos não deve ser desmerecida diante
da experiência. Isso porque o “a gente fomos” foi o que mais faltou aqui.
Quando escrevia assim, pensava n‘a gente”, nas viagens para Maceió, Bonito,
Garanhuns ou Martins. Na minha imaginação, viajar para Paris era dois carros
cheios de crianças no banco de trás, com dois casais e com um orçamento um
pouco apertado para todo mundo poder participar dos passeios, com direito a
coca-cola grande para todo mundo beber. Talvez seja por querer que esse momento
que eu tive fosse compartilhado que eu escrevo essa carta, porque essa viagem é
incompleta pela falta de “a gente”. Imaginar que vocês estão aqui comigo, mesmo
pelo whatsapp, foi muito importante.
Saudades.
(Preparem o feijão preto –com farofa- tô voltando).
Alexandre

